Pular para o conteúdo principal

Jack The Joker - Mors Volta

 Metal Progressivo é o nome dado ao subgênero que uniu as experimentações musicais do rock progressivo dos anos 70 com o peso e distorção do heavy metal dos anos 80. Nessa categoria estão juntos bandas com sons tão díspares quanto Symphony X e Opeth, clássicas como Dream Theater e inovadoras como Mastodon. O desafio é agregar ao metal elementos como o jazz, folk e música erudita e daí sair um resultado coeso, o que nem sempre ocorre, fazendo com que o estilo seja conhecido principalmente pelos seus excessos. Porém, o estilo também conta dentre suas características com a habilidade técnica de seus músicos, além da criatividade e inovação de seus compositores.

O paradigma do estilo foi definido nos anos 90 por bandas dos Estados Unidos e Europa, embora nunca tenha sido um estilo massificado, conquistou seu nicho de fãs e influenciou diversas bandas ao longo dos anos. O Brasil não chegou a produzir um grande nome no estilo, embora características do prog estejam presentes nas duas mais famosas bandas nacionais Angra e Sepultura. É certo que há uma grande quantidade de bandas de progressivo de inquestionável qualidade, mas ainda assim não há um grande representante nacional do estilo. Lacuna que pode ser preenchida com o trabalhando da banda cearense Jack The Joker.

Será cedo para dizer que a banda está aí para suprir essa lacuna? Após o ouvir o segundo e mais recente disco da banda, creio que não. 

"Jack The Joker" é um quinteto surgido em Fortaleza, lançou seu debut "In The Rabbit Hole" em 2014 e surpreendeu tanto pelo virtuosismo técnico de seus membros quanto pela altíssima qualidade das composições: intrincadas, complexas, ora mais extremas e pesadas, ora mais suave e acústicas, mas sempre coesas, sem se perder na virtuose de seus músicos. A banda vem divulgando seu trabalho principalmente através da internet, seus discos estão disponíveis em plataformas de streaming, youtube, download, venda física, além de intensa atividade no facebook oficial onde divulgam seus shows, lançamentos e vídeos.

Dois anos após a estreia, a banda lança seu segundo disco "Mors Volta". Dizem que o segundo disco é um teste. Os primeiros discos, em geral, são reuniões de composições que foram amadurecidas ao longo dos primeiros anos de ensaio e apresentações de uma banda, já o segundo chega com menos tempo e mais exigência para compor um disco inteiro, fechado e redondinho para lançamento. É quando a banda mostra a que veio, mostra seu poder de composição e capacidade de manter ou até superar a qualidade inicial. Jack The Joker passa no seu teste? Com louvor.

"Mors Volta" é superior a seu antecessor, mostra um banda com sua identidade definida, mas sem abandonar a criatividade com composições ainda mais coesas. A banda escolheu investir em peso e "groove" que permeiam todo o álbum dando um ar "jam" a certos trechos e chegando a ser quase dançante na canção "Brutal Behavior". É difícil dizer, no meio tantos músicos talentosos, quem se sai melhor, como os guitarristas Lucas Colares e Felipe Facó, milimetricamente técnicos ou a capacidade do vocalista Raphael Joer que consegue ir do gutural ao agudo, mas é preciso destacar a cozinha formada por Vicente Ferreira, cuja bateria executa dos movimentos complexos ao simples com precisão e o baixo de Lucas Arruda que injeta groove com seus slaps nos momentos certos de cada canção.

O disco impressiona desde seu início com as viradas de bateria que lembram muito a introdução de "The Wolf is Loose" do Mastodon, mas que segue numa pegada que lembra essa fase mais pesada de prog metal que o Symphony X vem mostrando desde "Paradise Lost", com a diferença que o Jack the Joker tem mais ritmo e menos interesse em compor baladas. O que não quer dizer que a banda não tenha um lado mais melódico, se em seu primeiro disco já haviam mostrado bom gosto ao enxertar instrumentos acústicos em algumas composições, em "Mors Volta" ela se guarda para o final. "Venus & Mars", canção de encerramento é a mais ambiciosa do disco, tem 24 minutos de duração e busca um síntese de toda a musicalidade apresentada pela banda: peso, groove, jams instrumentais, virtuosismo correndo solto, somados à adição de trechos acústicos belíssimos com flautas e violões construindo momentos contemplativos na cação, sem dúvida a melhor composição do disco. Tudo isso embrulhado numa capa cuja arte me remete ao primeiro disco do Black Sabbath, além de uma altíssima qualidade de gravação, basta uma audição atenta ao disco e todos os instrumentos se mostram claros e límpidos aos ouvidos, ressaltando o talento de cada músico.

Jack The Joker é uma banda que faz bonito e tranquilamente pode ser colocada ao lado dos grandes nomes do metal progressivo como Dream Theater, Opeth, Symphony X, etc. sem ficar devendo em nada aos clássicos. Só o que falta agora é o mundo e os metaleiros do Brasil conhecerem esse nome promissor do metal brasileiro.


Ouça no Spotify:



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Agente Secreto de Kleber Mendonça Filho - Um filme sobre cinema e memórias.

O Favorito para o Oscar O Agente Secreto é o mais novo filme de Kleber Mendonça Filho e o atual favorito brasileiro na corrida para o Oscar 2026 — uma corrida que já começa animada com a vitória, no concurso anterior, do filme brasileiro Ainda Estou Aqui , vencedor do prêmio de Melhor Filme Estrangeiro. É complicado fazer uma sinopse de O Agente Secreto sem entregar a história, porque ela vai sendo revelada em camadas ao longo do filme. Marcelo, personagem de Wagner Moura, é o protagonista da película. Ele chega ao Recife para ver o filho e fica hospedado no edifício de Dona Sebastiana. Tem um encontro marcado no Instituto de Identificação de Recife, onde há uma promessa de trabalho. Isso é o suficiente para, a partir daí, construir o mistério em torno desse homem que claramente está fugindo. A narrativa se passa nos anos 70 e tem como plano de fundo a ditadura empresarial-militar brasileira. Embora a ditadura em si não seja o centro da história, ela é parte integrante do cenário ...

Resenha: A Estrada da Noite, de Joe Hill – Um terror sobrenatural e visceral

Com a estreia de O Telefone Preto 2 nos cinemas, me lembrei do autor da história original, Joe Hill , e do meu primeiro contato com sua obra: o livro A Estrada da Noite ( Heart-Shaped Box , no original). Filho do lendário Stephen King , Hill mostra neste romance que o talento para o terror é, de fato, hereditário — mas com uma voz e estilo próprios que o diferenciam completamente do pai. Um astro do rock e um paletó assombrado A trama acompanha Judas Coyne , um ex-astro do rock pesado que vive recluso em uma fazenda, longe das turnês, drogas e da fama. Com um gosto peculiar por objetos macabros — como livros de receitas para canibais e fitas com assassinatos reais —, Jude leva uma vida excêntrica até decidir comprar, em um leilão online, um paletó “assombrado” pelo espírito do antigo dono, Craddock McDermott . O que parecia uma simples brincadeira mórbida se transforma em um verdadeiro pesadelo. O fantasma de Craddock passa a atormentar Jude com aparições assustadoras, um cheiro ...

🎵 Rick Wakeman lança “Melancholia”: um tributo instrumental à introspecção

  Para os amantes do rock progressivo , o nome Rick Wakeman dispensa apresentações. Lenda viva do gênero e tecladista da formação clássica do Yes , Wakeman também colaborou com ícones como David Bowie e Black Sabbath , além de construir uma carreira solo brilhante e prolífica . No dia 17 de outubro , o músico britânico lançou seu mais novo álbum: “Melancholia” , uma obra instrumental tocada inteiramente ao piano. O disco completa uma trilogia iniciada com Piano Portraits (2017) e seguida por Piano Odyssey (2018) . Segundo o próprio artista, trata-se de “uma suíte profundamente coesa, escrita de forma intuitiva e depois moldada em parceria com o produtor Erik Jordan” . Gravado em um piano clássico Steinway Modelo D , o álbum transmite uma atmosfera intimista e emocional, convidando o ouvinte a uma jornada de reflexão e serenidade. 💭 O significado de “Melancholia” segundo Rick Wakeman Em um vídeo de apresentação, Wakeman explica que a melancolia é um sentimento muitas vezes...